A campanha eleitoral para as Câmaras e Assembleias Municipais e para as Juntas de Freguesia anda na rua. É assim que dizem na televisão. A maior parte delas anda mesmo numa rua só, ou em duas, quanto muito. Nas ruas principais, naquelas onde as televisões podem ir. Mas as cidades e as freguesias estão cheias de ruas que a maior parte das candidaturas nem sabe que existem. Ruas estreitas em paralelo ou em terra, com subidas íngremes, sem pontos de recolha de lixo e sem comércio próximo. Em muitas dessas ruas há ainda outras mais escondidas que vão dar a “ilhas” e a espaços escondidos que não atraem turistas.
Há só uma candidatura que vai a esses sítios todos, que fala com as pessoas e que as trata pelo nome. Porque é a única candidatura que sabe que essas ruas existem e que essas pessoas existem. Em muitos caos, essas pessoas são a própria lista. Nunca percebi a questão da indecisão. É muito fácil decidir em quem votar. Só há uma hipótese que é a CDU, mesmo que se seja contra o voto ou se viva num daquela utopias hippies que estão à beira do fim, aqui retratadas pela GQ [en].
É claro que continua a haver gente que, de tão marginalizada que é, já não acredita em nada. Como os precários das entregas de mota que, finalmente, se começam a revoltar nas grandes cidades norte-americanas, como por exemplo em Nova Iorque, como relata o The Verge [en], mas ainda são poucos.
A imagem que levo destes primeiros dias de campanha é a de uma senhora a lavar escadas numa das principais ruas do Porto, ao mesmo tempo que toma conta do seu filho deficiente. Para além das escadas do prédio, também limpa o passeio e parte da estrada, que não são da sua responsabilidade, porque tem orgulho no seu ofício e mais responsabilidade pelo bem comum do que a Junta de Freguesia ou a Câmara Municipal. Com a propaganda da CDU no bolso da bata, o punho cerrado e o sorriso de orgulho no meio de tanta tristeza. É nesta precaridade que me revejo, porque foi nela que cresci.
O problema do fim dos ofícios não é só nacional, mas é sobretudo latino. Não se respeita o trabalho e para se ter um salário mais ou menos digno tem que se ir para universidade. Quando se é mulher, a coisa piora. O El Diário [es] justifica o facto de Espanha ser o país da OCDE com mais licenciados por isso mesmo. Enquanto não se pagar em condições e não se valorizarem os ofícios, o mundo não avança e continuaremos a ter arquitectas de limpezas, engenheiras de depilação, jornalistas de entregas e por aí fora.
Nas campanhas eleitorais, não importa quem ganha. O que importa é que não possam festejar em todo o lado, como queriam.